Griô do Amanhã: o futuro contado por vozes que imaginam novos mundos

Com formato híbrido, a obra mescla ficção e entrevistas.

Por Marcus Tavares

Em tempos em que o presente parece sufocado por crises, conflitos e retrocessos, imaginar o futuro pode ser, acima de tudo, um ato de resistência. Foi assim, entre sonhos, lutas e desejos de mudança, que nasceu o podcast Griô do Amanhã, uma audiossérie ficcional que propõe um olhar ecofeminista sobre o amanhã. O projeto, idealizado por Aline Souza, Karla Martins e Julia Coeh Ribeiro, transforma o som em ferramenta de provocação, memória e construção de utopias possíveis.

Disponível no Spotify e em todas as plataformas de áudio. 

IG: https://www.instagram.com/griodoamanha_podcast/ 

Spotify: https://open.spotify.com/show/6dzJZaaY461EhO6TgWyOYA 

Na narrativa, somos conduzidos pela voz de Moira, uma griô — mulher guardiã de histórias e saberes ancestrais — que guia um grupo de jovens por dentro do Museu do Patriarcado, uma exposição atemporal que reconta, no passado, as violências e desigualdades de gênero que um dia marcaram o mundo. Com episódios que misturam ficção, pesquisa e entrevistas com ativistas e especialistas, o podcast convida ouvintes de todas as idades a imaginar, juntos, caminhos para uma sociedade mais justa.

A seguir, confira o bate-papo da revistapontocom com Aline Souza, uma das criadoras da obra, que fala sobre a origem da ideia, os desafios da produção, o impacto junto ao público e a importância de pensar futuros possíveis — e desejáveis.

Aline Souza é jornalista e escritora do Norte de Minas, especialista em comunicação de causas sociais e ativismo em Organizações da Sociedade Civil.

Karla Martins – produtora cultural e de audiovisual da Amazônia, contadora de histórias e ativista de comunicação e meio ambiente.

Julia Coeh Ribeiro – artista, performer e roteirista brasileira afro argentina.

Aline Souza

revistapontocom – De onde surgiu a ideia do Griô do Amanhã?
Aline Souza –
A ideia veio através de um sonho que eu tive. A gente já queria tratar do tema do aborto e dos direitos reprodutivos, mas a gente não sabia como fazer isso sem cair no lugar comum. E a gente tinha que fazer isso em formato ficcional. À época o Brasil estava vivendo a votação do PL 1904 e a tentativa de revogação dos direitos das mulheres de abortar nas três únicas condições que a Lei permite (em casos de estupro, de fetos com anencefalia e em casos de riscos de vida para a mulher). As feministas do Brasil todo organizaram a campanha “Criança não é mãe”. Muito afetada por esse contexto, eu sonhei com a história de uma Griô, uma mulher sábia, que conta para crianças sentadas em roda como era a vida em um mundo patriarcal onde as mulheres eram perseguidas, um mundo que já não existia mais. Foi então que surgiu a ideia de criar a história de Griô do Amanhã, onde a personagem Moira guia um grupo de jovens por dentro de um museu atemporal, o Museu do Patriarcado. 

revistapontocom – Por que a escolha do ‘meio’ podcast?
Aline Souza –
O Instituto Toriba estava realizando uma capacitação de ficção para impacto social em 2024, o curso Tertúlias Ficção. Nele a gente tinha que criar uma ficção que abordasse um tema de interesse social. Mas como cinema é algo muito caro, e a gente tinha baixo orçamento, optamos pelo formato de podcast por ser barato do ponto de vista da produção. Mas esse formato também reserva desafios, pois não temos a opção das imagens e tudo precisa ser narrado por meio do som, por meio de diálogos e tal. Contratamos uma equipe maravilhosa e diversa para estar conosco nesse processo, desde roteiristas, produtor, editor, músico para criação de trilha, designer que fez a identidade visual e um elenco de artistas supertalentosos.

revistapontocom – Como foi o processo de construção dos episódios? De onde veio a inspiração para esse universo utópico?
Aline Souza
– Falar de futuro é algo necessário. A narrativa dominante no mundo hoje é a de catástrofe, de extinção, de conflitos e guerras. Precisamos mudar a ótica, precisamos recuperar a nossa capacidade de sonhar e de criar realidades positivas para o planeta e para nossa existência. Essa é a motivação central da criação de ficção para impacto social. Trabalhamos com muita pesquisa prévia, com dados reais, literatura acadêmica e científica para propor o cenário de futuro criado para a audiossérie que se passa no ano de 2.250, já que a projeção para que o mundo atinja a igualdade de gênero entre homens e mulheres é de cerca de 150 anos. E não tem como falar de futuro sem falar de desigualdades de gênero, de crise climática, de crescimento do ódio na internet, da ancestralidade dos povos indígenas e africanos, do meio ambiente, dos direitos reprodutivos e de evolução para uma sociedade mais justa e democrática. Com essa vontade, nós traçamos a linha dos episódios em formato de salas temáticas do Museu do Patriarcado, onde a Moira vai apresentando e tocando nesses temas. Também temos as entrevistas com pesquisadoras, escritoras, ambientalistas e ativistas que foi um outro processo para aprofundar os temas e convidar as pessoas a imaginar futuros com a gente.

revistapontocom – Qual é o objetivo do projeto? E quem é o público-alvo?
Aline Souza –
O nosso objetivo é mostrar que imaginar futuro é um exercício importante para recuperar nossa capacidade de criar saídas e não sucumbir ao caos. Griô do Amanhã é um podcast necessário. O público é multigeracional, pessoas de todas as idades.

revistapontocom – Como tem sido a devolutiva do público?
Aline Souza –
O público fica surpreso por não estar acostumado com podcast de ficção, que é algo ainda muito recente no Brasil. Assim como os estudos de futuro, uma área acadêmica muito comum em outros países. Todo mundo que escutou Griô do Amanhã nos escreveu sobre como a história gerou reflexões profundas de forma sutil e criativa.

revistapontocom – Qual é a importância de se pensar um futuro ecofeminista?
Aline Souza –
A importância de imaginar um futuro com a ótica ecofeminista é a gente entender que esse modelo de vida capitalista e patriarcal está nos aniquilando por completo. Não há mais como negar isso. E não há capitalismo sustentável. Tudo que existe hoje no mundo, existiu antes na cabeça e na mente de uma pessoa. Tudo que é criado, é antes imaginado. Sendo assim, a gente pode e é capaz de imaginar outra sociedade, outro modo de vida, outras formas de nos relacionar uns com os outros. O mundo precisa mudar e nossa proposta está em Griô do Amanhã.

revistapontocom – O que vocês aprenderam neste processo?
Aline Souza –
Aprendemos muito, principalmente com os desafios de trabalhar de forma remota com pessoas diversas e de diferentes partes do Brasil e da Argentina, pessoas que a gente nunca viu na vida, e criar algo juntos e levar adiante a produção com várias idas e vindas, cumprir os prazos e entregar um bom produto de entretenimento para o público. Foi uma jornada incrível realizar esse podcast e ele é muito especial para todas nós.

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